sábado, 22 de setembro de 2012


Jaraguá e Monte Mor: MPF processa Cagepa e Energisa por causa de abastecimento em aldeias

O Ministério Público Federal na Paraíba (MPF) ajuizou ação civil pública contra a Cagepa para obrigá-la a fornecer água nas aldeias indígenas de Jaraguá e Monte Mor, situadas em Rio Tinto (PB). O serviço encontra-se ameaçado de corte de energia elétrica pela Energisa, também ré na ação, em razão de débitos pendentes. Antes da via judicial, diversas reuniões e tentativas de conciliação, objetivando a assinatura de termo de ajustamento de conduta com a Cagepa, foram realizadas, mas não se obteve êxito.
Desde 2007, as aldeias sofrem com a interrupção frequente do fornecimento de água, sendo abastecidas com caminhões pipa, embora possuam abundância de fontes naturais, apesar da cobrança regular das faturas da Cagepa. Em resposta, a empresa, ao invés de melhorar a qualidade dos serviços, transferiu, mediante uma ata de reunião, realizada em 7 de janeiro de 2009, a administração do sistema para a associação indígena de Monte Mor, que passou a cobrar dos índios a tarifa de R$ 10,00. Divergências entre as aldeias de Monte Mor e Jaraguá levaram à suspensão dos pagamentos pelos índios, e a estação de captação passou a sofrer constante risco de corte de energia.
Em 15 de maio de 2010, o MPF advertiu a Cagepa quanto à ilegalidade da conduta e possível improbidade de seus dirigentes, recomendando a imediata retomada da prestação do serviço, para que depois fosse, pelas vias legais, transferido à Fundação Nacional de Saúde (Funasa), já que os indígenas não queriam mais que fosse prestado pela empresa estadual. Depois disso, por diversas vezes, a Cagepa comprometeu-se por escrito a realizar a retomada do serviço, pagou faturas de energia e, inclusive, realizou novos investimentos no sistema, como a construção de um poço adicional, concluído em dezembro de 2010.
No entanto, em julho deste ano, a energia do sistema foi cortada pela Energisa, sem aviso prévio. Com isso, não só as aldeias de Jaraguá e Monte Mor ficaram sem água, mas também grande parte da população de Rio Tinto (PB), que utiliza o sistema, inclusive escolas e postos de saúde, já que se trata de aldeias urbanas, com grande presença de não indígenas. O sistema somente foi reativado quando a cacique de Monte Mor assumiu uma dívida de R$ 43 mil e pagou, com a ajuda da prefeitura de Rio Tinto (PB), também afetada pelo corte, prestação de um parcelamento de R$ 5 mil.
Ciente do fato, o MPF exigiu da Cagepa cumprimento da recomendação, pondo fim ao que foi denominado na ação judicial “bizarra privatização do serviço público de abastecimento de água”. A nova administração da Cagepa, no entanto, mostrou crescente resistência. Nas ultimas reuniões, comparecia apenas um assessor jurídico da empresa, que depois de oferecer uma proposta de dividir com os órgãos federais os custos das faturas de energia pendentes, passou a defender que os órgãos federais assumissem integralmente os débitos retroativos, sustentando a validade jurídica da transferência do serviço público a particulares mediante ata de reunião. Inviabilizou-se, assim, qualquer tentativa de conciliação, tendo inclusive a Cagepa faltado injustificadamente à última convocação, em 6 de setembro de 2012.
Paradoxo – Para o procurador da República Duciran Farena, “chega a ser paradoxal que a Cagepa, que luta encarniçadamente contra qualquer proposta de municipalização de serviço de água no estado da Paraíba, como demonstram os casos de Sousa, Monteiro e Campina Grande, considere válida a privatização, sem lei nem licitação, do serviço para particular, como é o caso de uma associação indígena”. “Só pode ser preconceito”, frisou.
Duciran Farena ressaltou que deu por encerradas quaisquer tentativas de federalizar o fornecimento de água nas Aldeias Jaraguá e Monte Mor, mesmo para órgãos com capacidade jurídica para fazê-lo, como Funasa ou a Secretaria de Saúde Indígena. “Não faz sentido. O sistema não abastece somente aldeias indígenas, mas também boa parte da cidade de Rio Tinto (PB). Se a Cagepa não quiser mais, que procure a prefeitura e ofereça a municipalização. Mas antes, é claro, retome o serviço, regularize fornecimento e cobrança e pague as faturas de energia pendentes”.
O MPF encaminhará cópia da ação civil pública para o presidente da Assembleia Legislativa e Tribunal de Contas do Estado, para as providências cabíveis.
Pedidos – Em caráter liminar, o MPF pede para a Cagepa reassumir, imediatamente, a operação do sistema de abastecimento de água nas aldeias de Jaraguá e Monte Mor, tomando todas as providências para que o fornecimento não sofra interrupções. Pede-se, também, que ela realize a manutenção do sistema, com servidores técnicos qualificados, inclusive a devida cloração da água e pagamento das faturas de energia que se vencerão, assumindo, assim, a responsabilidade pelos débitos pretéritos com a Energisa.
Requer-se, também, que a Energisa não suspenda o fornecimento de energia em razão de débitos pretéritos, devendo orientar sua recuperação de débitos e futuras cobranças ao titular do serviço público, a Cagepa. Além disso, que sejam cancelados todos os débitos relativos ao sistema de abastecimento, que tenham sido assumidos por usuários indígenas, em especial pela cacique Claudeci. Para o caso de descumprimento, solicita-se a fixação de multa diária de R$ 10 mil para cada uma das rés.
No mérito, o MPF pede, entre outras coisas, a declaração de nulidade da transferência do serviço público à associação indígena, e a confirmação da responsabilidade da Cagepa no fornecimento de água às aldeias. Requer-se, ainda, a condenação das rés ao pagamento de danos morais de R$ 1 milhão (cada). O valor deve ser revertido aos potiguaras, para aplicação em ações de preservação da cultura, atividades educacionais, econômicas, de sustentabilidade, de preservação ambiental e de proteção e vigilância da terra indígena nas aldeias de Monte Mor e Jaraguá, sob a supervisão e acompanhamento da Fundação Nacional do Índio (Funai).
Da redação com informações do MPF.

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